(Retirado do site da União Budista do Porto)O Buda ensinou que o sofrimento é um aspecto inevitável da vida; esta é a primeira nobre verdade. Mas se parares aí e não aprofundares o ensinamento, não terás percebido nada. O Buda entendeu que temos primeiro de enfrentar a realidade do sofrimento antes de compreender a sua origem e descobrir a via para a libertação. Ao ter ele mesmo realizado o Caminho, o Buda não podia conservar o tesouro só para si. Por compaixão, sentiu-se compelido a dizer a todos os que o quisessem ouvir: a chave para a libertação reside em cada um de nós.Saber apenas isto sobre o ensinamento do Buda pode mudar a forma como tu e eu experienciamos o sofrimento. Se a libertação está nas nossas mãos, então temos poder. Podemos cortar através do condicionamento que nos faz sentir vítimas. Em contraste, quando um problema é percepcionado como exterior, sentimo-nos impotentes para o mudar. A libertação neste caso depende de ultrapassar ou afastarmo-nos do que ou de quem nos oprime. Se pensarmos em todos os problemas que há no mundo, poderíamos facilmente ficar desencorajados, perder a esperança, sobre algum dia encontrar a verdadeira paz de espírito. O ensinamento de Buda traz esperança e confiança na nossa habilidade de chegar à raiz do sofrimento.Há um koan sobre isto, um pequeno diálogo entre um estudante e um professor. O estudante já conhece o ensinamento básico do Buda de que a libertação do sofrimento tem de ser encontrada dentro de nós, mas saber isso não é o suficiente. Por isso pergunta ao professor: "Por favor, podes ajudar a libertar-me?" E o professor responde: "Quem te prende?" Todos nós devemos fazer-nos a mesma pergunta: "Quem me prende e me faz sofrer?" Buda fez essa mesma pergunta quando se sentou debaixo da árvore Bodhi. Tinha desistido de procurar respostas no exterior de si mesmo, e dirigiu a sua procura para o interior. Mas mesmo aí foi confrontado com o que aparentemente surgia como dificuldades externas. Feras perigosas tentaram atemorizá-lo e afastá-lo da sua procura, mulheres bonitas vieram para o distrair e seduzir. O Buda sabia que tinha de se sentar através de tudo o que surgisse e ser fiel ao seu voto. Resolveu continuar em meditação até encontrar a solução última para o problema do sofrimento. Continuou sentado com grande determinação e gradualmente as distracções desapareceram. Ao aprofundar o samadhi, encontrou um lugar de quietude e silêncio. Ainda nesse estado, olhou para o planeta Vénus e experienciou uma visão completamente diferente da realidade. Até esse momento tinha percepcionado tudo dualisticamente. De repente, toda a dualidade se desvaneceu, e não havia nenhum intervalo, nem a mais pequena separação entre ele e o planeta Vénus. Tinha realizado o lado absoluto da realidade.
Quando o Buda despertou, pôde ver que a Mente cria tudo; teve esta experiência verdadeiramente directa. A compreensão de que ele andava à procura não poderia ser encontrada - ele teria de experienciar ser Mente. Teria de experienciar não exterior, não cadeias, não começo, não fim. Experienciar esta Mente é ter a experiência da não separação, por isso, não há nada a temer ou a desejar. O Buda compreendeu que nada, nem a mais pequena partícula de poeira, existe fora desta Mente. Por isso pôde ver a causa do sofrimento: se eu crio tudo, então também crio a causa do meu sofrimento.
Para nos libertarmos, não basta ver de que forma causamos o nosso próprio sofrimento através do karma, a lei de causa e efeito. Temos de ver que estamos a criar o nosso sofrimento agora, momento a momento, ao estabelecer a ilusão da separação. A nossa forma condicionada de ver o mundo, a realidade convencional, é dualística. Apenas a experiência directa da realidade convencional a desvanecer-se nos pode convencer que temos estado a ver as coisas de uma forma destorcida. Quando vemos a nossa completude intrínseca, podemos parar de criar a ilusão da separação. Então a nossa mente incessantemente à procura pode descansar.